Desde 1995, a SOS Amazônia atua no Parque Nacional da Serra do Divisor e em seu entorno com o objetivo de assegurar a conservação dos recursos hídricos e florestais da região, como também promover o engajamento político a favor da proteção integral do Parque.
Cabe destacar ainda o empenho da ONG para elaboração e implementação do Plano de Manejo, o que possibilitou a avaliação ecológica da região, a identificação das famílias residentes dentro da Unidade de Conservação e no entorno imediato, e dos atrativos turísticos da Serra do Divisor.
Sob gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Parque enfrenta inúmeros desafios para seu desenvolvimento e conservação, apesar das diretrizes e orientações presentes no Plano de Manejo. O principal e mais recente deles é o Projeto de Lei 6024/2019, de autoria da deputada federal Mara Rocha (PSDB-AC), que propõe alterar os limites da Reserva Extrativista Chico Mendes e modificar a categoria do Parque Nacional, reduzindo sua classificação em Área de Proteção Ambiental (APA).
Para Miguel Scarcello, secretário geral da SOS Amazônia, a aprovação deste PL representa uma ameaça à proteção da biodiversidade e do modo de vida tradicional do Parque e da Resex, favorecendo o desmatamento e a ocupação ilegal de terras. “Querem abrir uma região frágil como Parque para exploração econômica e, na Resex, querem favorecer grileiros antigos”, alerta. O texto do Projeto de Lei defende que a recategorização do Parque é a maneira mais importante e adequada para a “conjugação e interesses” a favor do desenvolvimento do estado.
O interesse maior é a construção de uma rodovia entre Cruzeiro do Sul e Pucallpa, ligando o Brasil ao Peru. A estrada deverá cortar o Parque Nacional da Serra do Divisor e trará inúmeros impactos ambientais em seu trajeto. Por isso, a recategorização do Parque em APA é estratégica, visto que apresenta regras ambientais mais flexíveis e beneficiam apenas um grupo específico em detrimento de interesses da sociedade.
Projeto Harpia e Valores da Amazônia
Para oferecer resistência à aprovação do PL 6024/2019, a SOS Amazônia criou o Projeto Harpia com o objetivo de monitorar a agenda de políticas públicas relacionadas à conservação e gestão ambiental. Com financiamento do Instituto Clima e Sociedade (ICS), o Projeto Harpia possui dois eixos de atuação: advocacy (mobilização a favor de uma causa) e a implantação do Observatório de Políticas Públicas Socioambientais do Acre.
O biólogo, mestre em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais, Wendeson Castro, da SOS Amazônia, considera que a aprovação do PL é um exemplo de políticas sub-reativas, ou seja, de ações que caminham na contramão da proteção ambiental, inclusive de Unidades de Conservação, e atendem a interesses particulares em detrimento da sociedade. “O argumento é que essas unidades impedem o desenvolvimento econômico e a expansão da produção agrícola. Na realidade, nenhuma UC, seja de uso direto ou indireto, impede o desenvolvimento econômico de uma região. Nesta última categoria, o uso é mais restrito e cobre apenas 10% do território estadual”, conclui.
Em um artigo escrito com a colaboração de Eliz Tessinari, coordenadora de Comunicação e Publicidade da SOS Amazônia, Wendeson Castro reflete sobre os impactos e desdobramentos de políticas sub-reativas.
Os autores citam o Projeto Valores da Amazônia como demonstração do potencial econômico obtido com o desenvolvimento de cadeias de valor da sociobidiversidade com base em produtos florestais não madeireiros, como cacau silvestre, borracha e óleos vegetais (buriti, murmuru, cocão e andiroba). Executado em 2015, no Acre e Amazonas, o Valores da Amazônia ofereceu apoio a nove organizações e cooperativas, localizadas em áreas de difícil acesso da Floresta Amazônica, proporcionando notável avanço para extrativistas e indígenas.
Em 2019 e 2020, a SOS Amazônia ofereceu incentivo à produção de borracha CVP (Cernambi Virgem Prensado) em comunidades extrativistas da parte sul do Parque Nacional. O projeto foi executado em parceria com a fábrica de calçados Vert Shoes, empresa francesa instalada no Rio Grande do Sul.
Patrimônio natural
Localizada no extremo oeste do estado do Acre, nos confins da Amazônia brasileira, a Serra do Divisor ainda é um tesouro a ser descoberto. A paisagem exuberante, de grande riqueza ecológica e variedade de espécies endêmicas, configura um verdadeiro patrimônio da natureza e, devido a esses atributos, a região foi transformada em Unidade de Conservação, na modalidade de Parque Nacional, em 16 de junho de 1989.
A serra ganha esse nome por ser o divisor de águas de duas bacias hidrográficas da região: Médio Vale do rio Ucayali, no Peru, e Alto Vale do Rio Juruá, no Acre, que, com suas cabeceiras, abastecem significativos afluentes do rio Amazonas. A região concentra diversos atrativos cênicos e é o local ideal para receber uma infraestrutura turística capaz de acomodar, guiar, transportar, alimentar e informar os mais de mil visitantes que se estima por ano (2019).
Além dos serviços ambientais e ecossistêmicos assegurados com a proteção do Parque, cabe destacar o potencial turístico, científico e educacional da região, com formação geográfica exuberante e grande diversidade de espécies animais e vegetais, que chegam a totalizar a marca de duas mil espécies, conforme Plano de Manejo de 1998. De acordo com o Catálogo de Plantas das Unidades de Conservação do Brasil, sediado no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, o Parque Nacional da Serra do Divisor conta com 1.162 espécies de plantas vasculares conhecidas até o momento.
O Parque também reúne em seu entorno duas Terras Indígenas, Nawa e Nukini, localizadas na bacia do rio Moa.