Por Eliz Tessinari e Wendeson Castro
Neste dia da Amazônia, onde o mundo todo está atento com as constantes pressões humanas sobre a floresta e sua diversidade biológica, a SOS Amazônia destaca um dos seus principais resultados e mostra que Floresta em pé tem mais valor.
Foi pensando na valorização dos produtos florestais não madeireiros que a instituição construiu também o seu caminho. Embalada pelos ideais de um dos seus fundadores, o líder e seringueiro Chico Mendes, traçou e implementou dezenas de iniciativas com foco na preservação e conservação da biodiversidade e no desenvolvimento sustentável da região.
Produção da Borracha Folha Defumada Líquida - FDL | A FDL é uma inovação tecnológica de produção da borracha beneficiada, desenvolvida pelo LATEQ da UnB e permite maior agregação de valor ainda dentro da floresta. Fotos: SOS Amazônia | André Dib.
É fato que a Floresta Amazônica se apresenta como um grande potencial de produtos da sociobiodiversidade, possibilitando múltiplas alternativas para gerar trabalho e renda para os povos e comunidades tradicionais, conservando os recursos naturais. Um estudo na Nature Sustainability sobre alguns componentes do valor da floresta estima um montante de US$ 1,78 bilhões/ano (ou R$ 7.2 bilhões de reais) para a castanha e US$ 196 milhões/ano para a borracha na Amazônia Brasileira, cujo valor anual total de ambos representa cerca de 0,12% do Produto Interno Bruto (PIB) Brasileiro do ano de 2018, que totalizou 6,8 trilhões de reais.
Em áreas com alta produtividade de castanha (30 kg/hectare/ano), o valor deste produto florestal não-madeireiro pode alcançar até US$ 46 hectare/ano (ou *R$188,1 ha/ano) no Sul e Noroeste da Amazônia bem como no Sudoeste do Pará, mas em outras áreas da bacia um valor médio de US$ 5,05 ha/ano (ou R$ 20,6 ha/ano). E, o valor médio da borracha extraída em torno de US$ 0,56 ± 0.7 ha/ano (ou *R$2.3 ha/ano) mesmo em áreas com alta produtividade (rendimento ≥3.53 kg/ha/ano) e subsidiadas por governos.
Com apoio financeiro do Fundo Amazônia, por exemplo, a SOS Amazônia realizou ações para estruturar, fortalecer e integrar as cadeias de valor do Cacau Silvestre, Óleos Vegetais (açaí, buriti, andiroba, murmuru) e Borracha Nativa, em nove empreendimentos amazônicos, incluindo uma associação de mulheres e uma cooperativa indígena, alcançando 2.500 famílias, no Acre e Amazonas.
Essas ações fazem parte de uma das nossas iniciativas mais recentes: o projeto Valores da Amazônia, onde foram realizados serviços desde a organização socioprodutiva à prospecção de mercados internacionais para os produtos de base florestal não madeireiro, englobando atividades como Fortalecimento Organizacional; Assistência Técnica e Extensão Rural e Florestal – ATERF; Intercâmbios; Planos de Manejo; Certificação Orgânica; Estudos de Mercado e Participação em Feiras.
Resultados e impactos na Economia Florestal do projeto Valores da Amazônia
Os resultados e impactos na economia florestal do projeto Valores mostram o quanto o investimento nessas cadeias de valor é importante para reduzir a pressão humana sobre as florestas e sua biodiversidade.
Incremento dos produtos da sociobiodiversidade (Óleos vegetais, Borracha Nativa e Cacau Silvestre) | Valores da Amazônia
Como apontam os gráficos, a produção extrativista deu um salto muito significativo com o apoio nesses produtos da sociobiodiversidade. Os óleos vegetais (incluindo manteigas) saíram de 3,1 t/ano em 2014 para 23,4 t/ano em 2018, representando um aumento de 665% na produção. As borrachas (FDL, CVP e FSA) evoluíram de 7,3 t/ano em 2014 para 40,1 t/ano em 2018, representando aumento de 449%. E o cacau nativo saiu de 1,03 t/ano em 2014 para 9 t/ano em 2018, representando aumento de 770% na produção.
Enquanto, a Receita bruta total (considerando as três cadeias de valor) evoluiu de R$ 82.000,00 em 2014 para R$ 1.400.000 em 2018, com a comercialização dos produtos extrativistas pelas nove organizações apoiadas, representando um aumento de 1.600%.
Impacto na economia florestal | Valores da Amazônia
“Esse impacto na economia florestal impressiona. Ter um apoio como esse que recebemos do Fundo Amazônia, com certeza, gera transformações sociais e incentiva a conservação da floresta amazônica. É uma alternativa de alta rentabilidade e promove o desenvolvimento sustentável. Ao contrário do principal vetor do desmatamento, a pecuária, que gera renda com alto prejuízo aos habitats e grande impacto nos recursos hídricos, o que destaca o alerta severo do último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, o IPCC, para tomadores de decisão”, comenta o diretor técnico da SOS Amazônia, Álisson Maranho.
O Fundo Amazônia e a maior floresta tropical remanescente do planeta Terra
Em seus primeiros dez anos, o Fundo Amazônia, que consiste em uma iniciativa pioneira de financiamento de ações de Redução de Emissões Provenientes do Desmatamento e da Degradação Florestal, foi decisivo para 103 projetos por meio do apoio total acumulado em R$ 1,9 bilhões em 2018, que contribuíram para manter a atmosfera da Terra mais saudável possível.
Com este suporte, por exemplo, foram realizadas 687 mil missões de fiscalização ambiental, 746 mil registros de imóveis rurais no Cadastro Ambiental Rural (CAR), 338 instituições apoiadas de forma direta e por meio de parceiros, 465 publicações científicas ou informativas e, ainda, o apoio em 190 unidades de conservação e 65% das áreas indígenas da Amazônia.
Deste recurso, 60% é para a União, Estados e Municípios. E 38% para o Terceiro Setor, incluindo ONGs e Cooperativas
O Fundo Amazônia recebeu aproximadamente R$ 3,4 bilhões em doações até o final de 2018, sendo 93,8% provenientes do governo da Noruega, 5,7% do governo da Alemanha, por meio do KfW Entwicklungsbank, e 0,5% da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras). Na Amazônia Legal, que abrange todos os Estados da Região Norte e os Estados do Maranhão e Mato Grosso, foram 61 projetos apoiados.
Papel da Amazônia no Clima Global
Estima-se que a Amazônia detém 390 bilhões de árvores e estoca 86 Pg de Carbono, detém o maior pool de biodiversidade do sistema terrestre e desempenha um papel vital no sistema climático global.
Por meio da fotossíntese e respiração a Amazônia processa cerca de duas vezes a taxa de emissão de combustíveis fósseis, respondendo por cerca de 15% da produtividade primária líquida e desempenhando um papel vital para saúde do sistema terrestre.
Com uma flora arbórea estimada entre 10.071-16.000 espécies, apenas cerca de 227 espécies arbóreas, as “hiperdominantes da Amazônia”, representam metade do total de árvores de toda a Bacia, dentre as quais, a espécie mais abundante é o Euterpe precatoria, o açaí, com uma população estimada em 5,21 bilhões de açaízeiros.
Uma das onze espécies de seringueira, a Hevea brasiliensis (Willd. ex A.Juss.) Müll.Arg., ocupa a décima quarta posição no rank das espécies mais abundantes com 1.91 bilhões de seringueiras vivendo na maior floresta tropical remanescente do sistema terrestre, a Amazônia, - fornecendo o “Venha a nós o vosso leite, para o sustento de nossas famílias [...] Seringueira que estás na selva, multiplicados sejam os vossos dias [...] Ajudai a nos libertar das garras do regatão”, nas palavras de Jaime Silva Araújo, o primeiro Presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros e autor do “Pai nosso dos Seringueiros”.
Referências
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