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Projeto Nossabio fortalece gestão em Unidades de Conservação

Por Bleno Caleb

Cerca de 315 famílias são contempladas com o desenvolvimento do projeto Nossabio, que tem como objetivo fortalecer a gestão comunitária e estruturar cadeias de valor em cinco Unidades de Conservação (UCs): Reserva Extrativista Chico Mendes, Reserva Extrativista do Cazumbá-Iracema, Floresta Nacional de São Francisco, Florestal Nacional do Macauã (no Acre) e Parque Estadual de Guajará-Mirim (em Rondônia). O Nossabio compõe o Legado Integrado da Região Amazônica (Lira), uma iniciativa idealizada pelo Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) para aumentar a efetividade de gestão das áreas protegidas da Amazônia.

Fabiana Prado, gerente do Projeto Lira/IPÊ, considera que o diferencial do Nossabio é a articulação em rede entre organizações, empresas e poder público, o que potencializa as ações e otimiza os recursos. “O projeto fortalece a governança das comunidades e os diferentes instrumentos de gestão, com destaque para as cadeias produtivas e a intermediação com o setor privado para garantir a comercialização do que é produzido no local”, explica. A SOS Amazônia é responsável pela gestão operacional do projeto em estreita ligação com organizações sociais, cooperativas e associações extrativistas de cada uma das unidades.


As atividades do projeto iniciaram em setembro de 2020, com a realização de oficinas de apresentação e planejamento comunitário, respeitando os protocolos de prevenção da covid19, como o distanciamento físico e o uso de máscara e álcool em gel. A fim de alinhar as propostas com a realidade local das comunidades, as oficinas tiveram a participação de membros da SOS Amazônia, do Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade (ICMBio), gestores das UCs, representantes das comunidades e instituições parceiras.

“Construímos o planejamento das atividades com os moradores. Definimos o cronograma, a frequência de viagens de campo, as atividades a serem desenvolvidas e a contrapartida das comunidades, que vai desde a participação em oficinas até a limpeza das estradas de seringa”, conta Álisson Maranho, secretário técnico da SOS Amazônia.

A partir desses encontros, foi feito um diagnóstico simplificado do contexto socioambiental de cada propriedade, a fim de descobrir a renda familiar, a produção local e a situação ambiental do terreno. Esse diagnóstico é decisivo para a definição de estratégias de atuação em cada UC e para a diversificação das atividades econômicas, por meio das cadeias de valor.

“Tivemos o cuidado de selecionar cadeias produtivas que já eram de interesse das famílias ou que já estavam em desenvolvimento dentro das comunidades. A gente acredita que desenvolver atividades produtivas de baixo impacto nessas unidades de uso sustentável é um caminho para trazer renda às famílias”, avalia Maranho.


Oficina de apresentação do Projeto Nossabia em comunidade da Reserva Extrativista Chico Mendes (Acre). Foto: SOS Amazônia

Cadeias de valor
Dentre as atividades produtivas, foram elencados alguns produtos da sociobiodiversidade, como açaí, cacau, látex e madeira. O ecoturismo também integra as cadeias de valor. Na Resex Chico Mendes, essa é uma iniciativa em andamento, realizada pelo ICMBio em parceria com a Secretaria de Empreendedorismo e Turismo do Acre, que visa promover o ecoturismo de base comunitária. O investimento do Nossabio possibilitará a estruturação da trilha, a realização de capacitações e a produção de materiais informativos para promover os atrativos e as normas de visitação.

O cacau silvestre ainda não é utilizado comercialmente pelas comunidades da Resex Chico Mendes e das Flonas de Macauã e São Francisco, mas apresenta grande potencial de mercado. O fruto ocorre em abundância nas florestas próximas ao rio Iaco e pode ser utilizado na fabricação de chocolate, a exemplo de experiências bem sucedidas em outras regiões da Amazônia. A estruturação dessa cadeia agrega 50 famílias e consiste em levar técnicas de manejo para aumento da produtividade e de beneficiamento das amêndoas na própria comunidade.

Uma novidade é a cadeia de valor com base em artefatos de madeira e outros produtos da floresta, como sementes e ouriço de castanha, coletados após o manejo florestal comunitário executado na Resex Chico Mendes, em Xapuri. A estruturação dessa cadeia oferece um destino comercial ao resíduo do manejo e possibilita o desenvolvimento de uma atividade econômica com a criação do “Atelier da Floresta”, uma unidade para produção de objetos, utensílios e peças artesanais de escala comercial. A implantação desse espaço demanda a construção de uma estrutura predial moveleira, aquisição de máquinas e oficinas de capacitação para um grupo de 30 pessoas.

Outra cadeia de destaque é a de borracha CVP (cernambi virgem prensado), tendo em vista a alta demanda por esse produto pela fábrica de calçados Vert Shoes, empresa francesa instalada no Rio Grande do Sul. Além disso, a produção abastece a usina de borracha da Cooperacre (Cooperativa Central de Comercialização Extrativista do Acre), sediada no município de Sena Madureira, que produz o GEB (granulado escuro brasileiro), destinado a confecção dos solados para os tênis.

Por meio do Projeto Nossabio, será feito o repasse de ferramentas e insumos para extração do látex, a reabertura de estradas de seringa, bem como a realização de capacitações de boas práticas de manejo para aumento da produtividade. A estimativa é produzir de 25 a 35 toneladas por ano, o que contribui para a geração de renda e a manutenção da floresta em pé.

Para Adair Duarte, coordenador de Projetos da SOS Amazônia, o investimento nessas cadeias de valor é estratégico para conter o desmatamento nas colocações. “Quando as famílias passam a enxergar o território como alternativa/fonte de renda, elas deixam de desmatar a floresta para transformar em pasto para a pecuária”, acredita. Duarte complementa que os produtos obtidos nessas cadeias têm destino comercial. “O projeto foi pensado desde a organização da comunidade, o trabalho de coleta, manejo e beneficiamento, até a comercialização. O produtor já tem a garantia da empresa que vai comprar e uma estimativa do preço que será pago por aquele produto”, ressalta.

Equipe do Projeto Nossabio em deslocamento. Foto: SOS Amazônia

Governança
O Nossabio foi aprovado em dezembro de 2019, por meio do Projeto Lira (Legado Integrado da Região Amazônica), programa brasileiro de conservação idealizado pelo Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), com recursos do Fundo Amazônia e da Fundação Gordon e Betty Moore. O programa foi concebido para aumentar a efetividade de gestão das áreas protegidas da Amazônia (unidades de conservação e terras indígenas).

A proposta é investir no fortalecimento de organizações, cooperativas e associações extrativistas com capacidade de fazer a gestão dos recursos, a fim de garantir sua aplicação dentro de cada território. Para tanto, o IPÊ abriu editais em todo o bioma amazônico, dividindo a região por blocos, e em cada um deles elegeu as UCs prioritárias. A Rede LIRA é formada por oito projetos nos seis blocos territoriais, nos estados do Acre, Amazonas, Mato Grosso, Pará e Rondônia.

As UCs contempladas possuem problemas comuns, dentre eles, a fragilidade na governança do território, o baixo investimento em atividades produtivas, a falta de conhecimento sistematizado sobre o potencial ecoturístico e a dificuldade de comercialização do que é produzido no local. “A ideia é que essas associações e cooperativas sejam mais fortes e atuantes”, finaliza Álisson Maranho.

Organizações sociais apoiadas

AMOPREAB – Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes em Assis Brasil
AMOPREBE – Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes em Brasileia e Epitaciolândia
AMOPRESEMA – Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes em Sena Madureira
AMOPREX – Associação dos Moradores e Produtores da Reserva Extrativista Chico Mendes em Xapuri
ASSC – Associação dos Seringueiros do Seringal Cazumbá – Sena Madureira
ASSEXMA | COOPERIACO – Associação dos Extrativistas da Floresta Nacional do Macauã e Área de Entorno – Sena Madureira


Desafio: equipe enfrenta dificuldade para chegar à comunidade extrativista. Foto: SOS Amazônia
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